Em vésperas de uma das mais importantes datas do calendário português, o 25 de Abril, quero deixar convosco uma genialidade de um verdadeiro génio, que em muito ajudou a que fosse possível a revolução dos cravos, fazendo da poesia uma verdadeira arma da resistência fascista, José Carlos Ary dos Santos. Autor de poemas icónicos do cenário nacional, Ary dos Santos, deixou um antes e um depois da sua passagem pela terra, poemas que se transformaram nas melhores músicas do século XX, como, "a desfolhada", "os putos" "Lisboa menina e moça" e tantas outras que ainda hoje passam nas rádios.
Em plena ditadura, corria o ano de 1938, nasce Ary dos Santos. Cedo o seu bichinho pela escrita nasce e já na adolescência, então com 16 anos vê os seus poemas serem escolhidos para o prémio Garret. Ary começou a sua militância em 1969 no Partido Comunista Português, mesmo tendo descendência de famílias aristocratas sempre procurou lutar contra o tipo de sociedade em que tinha crescido, e os seus poemas são na sua generalidade acerca do socialismo e da esperança do surgimento de uma sociedade diferente para o Portugal que estava prestes a transformar-se com o 25 de Abril de 1974.
Ary dos Santos - Pensador, citações |
A genialidade que vos quero deixar está relacionada com a data que se avizinha. Aqui, neste belo poema, declamado várias vezes pelo próprio Ary dos Santos, ficamos a perceber melhor esta data, desde o porquê da revolução, da necessidade de mudar de sistema até ao que se esperava depois da revolução. As esperanças eram muitas, a memória era recente e a sociedade era extremada. Mas hoje as esperanças são poucas, a memória parca e nós, simples cordeiros que segue o rebanho. Por isso urge ler, ouvir e ficar a conhecer esta obra prima de Ary dos Santos, "As portas que Abril abriu" para não se deixar morrer o pouco que ainda sobra de Abril e lembrar que o que temos de liberdades e garantias resultaram da revolução de um povo, numa madrugada de 25 de Abril.
Ouvir Ary dos Santos a declamar "As portas que Abril abriu" |
E aqui fica o excerto escrito escolhido por mim.
homem novo capitão
mas também tinha a seu lado
muitos homens na prisão.
Posta a semente do cravo
começou a floração
do capitão ao soldado
do soldado ao capitão.
Foi então que o povo armado
percebeu qual a razão
porque o povo despojado
lhe punha as armas na mão.
Pois também ele humilhado
em sua própria grandeza
era soldado forçado
contra a pátria portuguesa.
Era preso e exilado
e no seu próprio país
muitas vezes estrangulado
pelos generais senis.
Capitão que não comanda
não pode ficar calado
é o povo que lhe manda
ser capitão revoltado
é o povo que lhe diz
que não ceda e não hesite
– pode nascer um país
do ventre duma chaimite.
Porque a força bem empregue
contra a posição contrária
nunca oprime nem persegue
– é força revolucionária!
Foi então que Abril abriu
as portas da claridade
e a nossa gente invadiu
a sua própria cidade.
Disse a primeira palavra
na madrugada serena
um poeta que cantava
o povo é quem mais ordena."
Espero que tenham gostado. Ver também
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