António Pedro Ribeiro - parte 2/2 - «Eu penso que é terrível estarmos numa sociedade dominada pelo medo.»
CC - É muito crítico para com a Sociedade actual… Que fragilidades lhe aponta? Como melhorá-la?
António Pedro Ribeiro - Eu penso que é terrível estarmos numa sociedade dominada pelo medo, onde as pessoas se atropelam, onde competem umas com as outras, onde quase se limitam a lutar pela sobrevivência. O novo deus- o outro está morto como proclamou Nietzsche- é o dinheiro, por ele vende-se pai e mãe, a ele quase nada escapa. Nascer, trabalhar, morrer. É para o sacrifício, para a culpa que parece que estamos aqui na Terra. Quando não se morre de fome, morre-se de tédio. Assim a vida não é vida. Os políticos ao serviço dos mercados, dos banqueiros, dos especuladores e dos capitalistas, os pregadores da morte, os inimigos da vida, como dizia Nietzsche, são corruptos e vigaristas e roubam-nos os salários, as pensões, o tempo, a própria vida. Os media fazem-nos lavagens ao cérebro com programas imbecis, com comentadores vendidos, com notícias manipuladas. Perante este cenário há duas saídas: a revolução das mentalidades e a revolução política. Penso que, apesar de tudo, há alguma esperança com o Syriza na Grécia, com o Podemos em Espanha e com os avanços da esquerda na América Latina. A revolução das mentalidades passa pela consciencialização das pessoas de que esta "vida" não serve, passa pelas leituras, pela arte, pela música, passa pela filosofia, pela discussão destes problemas na praça pública. Passa também pela transmissão de conhecimentos, pelas escolas, pelos ensinamentos dos pais, dos professores, dos livres pensadores, daqueles que não estão rendidos à máquina, já que neste momento, na grande maioria dos casos, as crianças e os jovens são encaminhados para a competição, para o mercado, para a manha. De qualquer forma, penso que nos próximos 10, 20, 30 anos haverá uma grande revolução, nem que seja por causa das catástrofes naturais que aí vêm. Teremos que chegar à conclusão que não é justo que andemos a contar os trocos ou a morrer de fome enquanto estes bandidos fascistas nadam em milhões e acumulam. Teremos de nos revoltar mais tarde ou mais cedo.
CC - A Literatura é uma ferramenta de transformação do mundo?
António Pedro Ribeiro - Sim. Houve poetas e escritores que, com as suas obras e ideias, mudaram o mundo. Pode não ser logo, pode não ser em vida mas acabam por mudar, por influenciar. Eu, modestamente, tento fazer a minha parte, quer na escrita, quer no palco, quer na apresentação pública.
CC - Um escritor tem um estilo de vida próprio?
António Pedro Ribeiro - Há escritores e escritores. Há os versejadores da corte, aqueles que se colam aos poderes, aqueles que se vendem e há aqueles que vivem como poetas, os malditos, os homens livres como Henry Miller, Bukowski, Allen Ginsberg, Léo Ferré, Nietzsche, Sade, Céline, Jim Morrison, Rimbaud, Luiz Pacheco, Cesariny, Sebastião Alba, Jaime Lousa, Joaquim Castro Caldas. Há aqueles que desafiam o instituído e gritam "nem Deus, nem amos!".
CC - Quais os seus projectos para o futuro?
António Pedro Ribeiro - Nos últimos oito anos publiquei 10 livros. Há que fazer uma pausa. Até porque há textos que publiquei em livro que agora não publicaria. Tenho de gastar mais tempo a corrigir, a depurar os textos. De qualquer forma, estou a preparar um livro que fala dos filmes da minha vida. Além disso, gostaria de fazer um espectáculo com textos dos poetas do rock misturados com poemas meus e, claro, quero participar na revolução vindoura.
CC - A maior parte dos leitores do nosso blog são jovens, que mensagem gostaria de lhes transmitir?
António Pedro Ribeiro - Aconselho-os a ler muito, a estudar muito os mestres, a compreender o mundo. Aconselho-os a criar no papel, no computador, na tela, no palco, a descobrir que há outro mundo de amor, liberdade e poesia, que o capitalismo não é eterno. Aconselho-os a discutir estas questões, a duvidar, a não se deixarem levar por esta máquina terrível. A ouvir aqueles que me influenciaram e me ajudaram a fazer a ruptura: Doors, Lou Reed, Pink Floyd, Led Zeppelin, Nirvana, Joy Division, Bob Dylan, John Lennon, José Afonso, UHF, Mão Morta. A buscarem a vida gratuita, de que falava Agostinho da Silva.
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